quarta-feira, março 02, 2005

Língua Portuguesa

Hoje, e inspirado num texto que li há alguns tempos, vou-me dedicar a uma análise acerca do uso do calão na Lingua Portuguesa...
O nível de stress de uma pessoa é inversamente proporcional à quantidade de "foda-se!" que ela diz. Existe algo mais libertário do que o conceito do "foda-se!"? O "foda-se!" aumenta a minha auto-estima, torna-me uma pessoa melhor, reorganiza as coisas, liberta-me.
"Não queres sair comigo?! Então, foda-se!" "Vais querer mesmo decidir essa merda sozinho?! Então, foda-se!"
O direito ao "foda-se!" deveria estar assegurado na Constituição. Os palavrões não nasceram por acaso, são recursos extremamente válidos e criativos para dotar o nosso vocabulário de expressões que traduzem com a maior fidelidade os nossos mais fortes e genuínos sentimentos. Como o Latim Vulgar, será esse Português Vulgar que vingará plenamente um dia.
"Comó caralho", por exemplo. Que expressão traduz melhor a ideia de muita quantidade que "comó caralho"? "Comó caralho" tende para o infinito, é quase uma expressão matemática. "A Via Láctea tem estrelas comó caralho!", "o Sol é quente comó caralho!", "o universo é antigo comó caralho!" "Tás chato comó caralho!"
Há outros palavrões igualmente clássicos. Pense na sonoridade de um "Puta que pariu!", ou seu correlativo "Pu-ta-que-o-pa-riu!", falado assim, cadenciadamente, sílaba por sílaba. Diante de uma notícia irritante, qualquer "puta-que-o-pariu!", dito assim, põe-nos outra vez nos eixos. Os nossos neurónios têm o devido tempo e clima para se reorganizarem e encontrarem a atitude que permitirá dar um merecido troco ou livrarer de maiores dores de cabeça.
E o que dizer do nosso famoso "vai levar no cu!"? E a sua maravilhosa e reforçadora derivação "vai levar no olho do cu!"? Já imaginaram o bem que alguém faz a si próprio e aos seus quando, passado o limite do suportável, se dirige ao seu interlocutor e solta: "Chega!Vai levar no cu!"? Pronto, retomas as rédeas da tua vida e a tua auto-estima.
E seria tremendamente injusto não registar aqui a expressão de maior poder de definição do Português Vulgar: "Fodeu-se!", e a sua derivação, mais avassaladora ainda: "Já se fodeu!". Conhecem definição mais exacta, pungente e arrasadora para uma situação que atingiu o grau máximo imaginável de ameaçadora complicação? Expressão, inclusivé, que uma vez proferida insere o seu autor num providencial contexto interior de alerta e auto-defesa. Algo assim como quando estás a conduzir bêbedo, sem documentos do carro, sem carta de condução e ouves uma sirene de polícia atrás de ti a mandar-te parar. O que dizes? "Já me fodi!"